quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Meus quatorze anos

Meu irmão fez quatorze anos a quatro meses atrás. Para os que já passaram dessa idade sabe o quanto ela é importante, pois representa o momento de transição infância/adolescência. Logicamente sem desprezar o tempo de maturação segundo a individualidade de cada um, mas é mais ou menos nessa idade. Pra mim, pelo menos, foi crucial! Eu, um jovem interiorano sem grandes aspirações, estudante de um colégio público ansioso pelo primeiro beijo ou na esperança de uma macarronada no cardápio do dia, enquanto caminhava a passos lentos para o futuro. Seguia minha rotina sem jamais procurar compreender o que estava a minha volta, mas ciente de que havia algo errado. Via discrepâncias na sociedade e atitudes estranhas no dia-a-dia. Na minha ida colégio/casa e casa/colégio a pé – cerca de 30 a 40 minutos – passei a observar determinadas atitudes que em forma crescente passaram a me incomodar. Seres humanos sendo tratados de forma diferentes. Passei a me questionar o porquê de tal atitude, mas, eu era apenas um jovem de quatorze anos. Branco, com uma família em ascensão a classe média baixa, deveria não questionar, mas sim me centrar a um objetivo que me deixasse rico. Assim me diziam na escola. “Vocês estão aqui para se tornar alguém” bradavam os professores em alto e bom som. Segundo essa lógica, jamais seria alguém. Sempre fui um péssimo aluno, com inúmeras notas vermelhas e várias suspensões tendo passado por todos os colégios públicos do Centro de Valença. A escola para mim era uma obrigação imposta pela família para que “eu me tornasse alguém”. Logicamente que meus familiares estavam corretos diante de tal perspectiva, pois o diploma final me daria a oportunidade de angariar novas horizontes. Mesmo com todos esses conselhos não conseguia me adequar e aceitar tal ambiente. Escola sempre foi uma tortura.


No início apanhava quase todos os dias dos outros alunos pelo fato de ser branco, sendo suprimida tal atitude após perceberem que cor não denomina classe, pois suas buscas por “dinheiro para salgado” ou “merenda” eram em vão. Não possuía tal luxo. Usufruía, assim como eles, do almoço dado pelo Estado. Aqueles que se tornaram meus amigos eram em sua maioria moradores de fazendas com o pai se submetendo a um latifundiário ou residiam em bairros estigmatizados pela elite. Eles iam de chinelo, roupa encardida e com o cheiro desagradável. Era um dos poucos privilégios que eu tinha. Possuir um tênis, mesmo que razoável, e sempre ir com a roupa limpa. Exigência da minha mãe. Esses amigos que antes me sacrificavam agora caminhavam lado a lado comigo, contando suas histórias e sonhos. A cada dia me surpreendia com seus desabafos e eu via que minha vida era de um milionário diante da deles. Enquanto eu repetia o prato no refeitório por uma fome momentânea, a maioria deles era a única refeição do dia. Eles não tinham televisão. Alguns nunca colocaram um sapato. Relatavam brigas domésticas dos pais, enquanto outros largavam o colégio diante das exigências da família para que trabalhassem.

No meu longo caminhar para casa me deparava com estudantes de colégios particulares e seus tênis e roupas caras, enquanto seus pais iam buscá-los de carro na porta do colégio. Perguntava-me como podia aquilo. Passei a questionar meus pais, vizinhos, professores e sempre ouvia resposta parecida. “Deus quis assim”. Não era possível! Seria Deus um Diabo pra permitir tamanho sofrimento para alguns e conforto para outros. Meus dias se tornaram um tormento. Eu, ali, inerte, com apenas quatorze anos, angustiado, com uma realidade que iria se tornando aguda dia após dia. Devia ter uma saída, mas não a encontrava. Até que numa manhã de junho enquanto folheava o livro didático de História numa das chatíssimas aulas de Matemática encontrei algo interessante. Vi a figura de um homem estranho e assustador. Seu olhar era centrado. Passei a ler o capítulo a título de curiosidade para saber o que diabos uma figura tão tenebrosa teria tamanha importância a ponto de conseguir uma foto em um livro de História. Foi, ali, naquele momento que minha vida mudou desde então. O capítulo contava a história de uma maioria oprimida, que, subverteu uma ordem imposta durante séculos. O capítulo? Revolução Russa, com Leon Trotsky sendo o ser estranho. Dali em diante o interesse por tal assunto e a busca por algo que aliviasse minha consciência levou-me a buscar na biblioteca da cidade algo sobre aqueles heróis: o POVO! Desde então, aquele menino do interior percebeu uma coisa. Que somente quando os oprimidos se enxergarem como classe e lutarem por si e para si é que haverá uma sociedade justa e igualitária. Sim, é possível. E assim, com quatorze anos virei comunista!

3 comentários:

  1. Ae, bem-vindo ao mundo blogueiro.

    Fikdik: se tiver com preguiça de escrever, jogue um vídeo, uma foto, uma piada, klkr coisa. ajuda a manter a relação com o blog e n desanimar.

    abs!!

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  2. Faço das palavras do Tai minhas, menos o "Fikdik" pq é chatão quando ele fica mandando vídeos no blog e nenhum texto. =)

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  3. Valença, querido amigo. Posso colocar teu blog nos meus links favoritos?

    Abraços,
    Erick.

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